O acidente de trajeto se equipara ao acidente de trabalho? Esse é o ponto principal que devemos observar quando tratamos do acidente que acontece com o trabalhador em sua rota habitual entre o trabalho e sua casa.
Algum direito mudou no acidente de trajeto, também chamado acidente de percurso?
É verdade que durante um curto período alguns direitos previstos na CLT foram alterados por uma medida provisória. Por alguns meses a MP 905 retirou do trabalhador vítima de acidente de trajeto a mesma proteção do acidente de trabalho.
Isso não quer dizer que acidentes de trajeto anteriores e posteriores a esse intervalo limitado de tempo estejam sujeitos a mesma interpretação da MP 905, pois ela não foi transformada em lei.
1 – O que é acidente de trajeto?
O acidente de trajeto ou acidente de percurso caracterizam a mesma situação: aquele acidente em que o trabalhador se envolve no caminho da casa para o trabalho ou do trabalho para casa.
Para ser considerado acidente de trajeto o trabalhador deve estar no percurso da sua rota habitual, no deslocamento que faz parte da rotina.
O que a lei não aceita são os desvios da rota. Vamos dizer que entre o trabalho e a residência o empregado foi a um restaurante, ao cinema ou um passeio no shopping.
Nesse caso, deixa de configurar acidente de trajeto porque essa não é a rota cotidiana do trabalhador.
A Justiça costuma analisar esses casos entendendo o tempo gasto pelo empregado no deslocamento. Se o trajeto costuma ser feito em 40 minutos, por exemplo, irá avaliar se esse mesmo período se deu no acidente que o trabalhador está alegando como acidente de trajeto.
Outro questionamento que é bastante comum: é preciso estar em um veículo da empresa?
A lei não faz essa distinção. Não importa o modo de locomoção: o trabalhador pode estar de carro, ônibus, moto, bicicleta ou até mesmo pé.
2 – Acidente de trajeto é acidente de trabalho?
Sim, o acidente de trajeto voltou a ser considerado acidente de trabalho.
No entanto, a data em que o trabalhador se viu envolvido nesse tipo de ocorrência é muito importante.
Entre 12 de novembro de 2019 e 20 de abril de 2020 vigorou a medida provisória 905, que pretendia instalar o contrato verde e amarelo. Foi um período em que o brasileiro perdeu inúmeros direitos.
Entre eles, que o trabalhador e segurado do INSS vítima de acidente de trajeto pudesse contar com a mesma proteção trabalhista e previdenciária de quem sofreu um acidente de trabalho, em caso de uma incapacidade temporária ou permanente, ou mesmo que falecesse.
Durante o tempo em que a MP ficou valendo, o acidente de trajeto foi excluído do rol dos acidentes de trabalho, suprimindo direitos como a estabilidade de um ano no emprego, aposentadoria por invalidez acidentária e depósito do FGTS pelo empregador pelo período em que ficasse afastado pelo INSS, entre outros.
Como não foi convertida em lei pelo Congresso Nacional, a medida perdeu seu efeito a partir de 21 de abril de 2020.
3 – Quando comunicar empregador sobre o acidente de trajeto?
Diferente do acidente de trabalho, que acontece no espaço físico da empresa, não há como o patrão saber da ocorrência de um acidente de percurso sem a comunicação expressa do empregado.
O empregado deve comunicar a empresa no prazo de um dia, de preferência por escrito, em e-mail ou pelo WhatsApp. Em caso de morte, a família deve fazer essa comunicação imediata.
E por que essa urgência?
A empresa tem um prazo para emitir a CAT – Comunicação de Acidente do Trabalho e informar o INSS. Esse prazo é de até o primeiro dia útil seguinte, no caso de acidente, ou imediatamente, se o empregado falecer.
A comunicação imediata é a prova de que o trabalhador sofreu esse acidente no deslocamento entre o trabalho e casa, evitando que futuramente a empresa conteste esse fato, pois à época foi levado ao conhecimento dos seus superiores.
4 – A CAT e o acidente de trabalho
Exija a emissão da CAT e guarde uma via como prova. Esse documento comunica oficialmente seu acidente de trajeto aos órgãos competentes do governo.
Se o empregador se negar a emitir a CAT, o seu sindicato, seus dependentes, seu médico ou autoridades públicas podem registrar essa comunicação. Uma opção ainda melhor é recorrer ao CEREST ( Centro de Referência em Saúde do Trabalhador) da sua região.
Neste artigo eu coloquei uma lista bem completa das unidades do CEREST em todo o país.
Com a prova de que o empregador teve conhecimento do acidente ocorrido, vai ficar mais fácil receber o benefício correto do INSS. Dê total atenção a esse documento porque desse registro irão depender seus direitos trabalhistas e previdenciários.
Resumindo a importância da CAT
- é a prova do acidente
- garante o recebimento do benefício correto no INSS (tipo acidentário e não previdenciário
- auxilia na prova, caso o trabalhador tenha complicações com a saúde no futuro
- aumenta a responsabilidade do empregador, caso o número de acidentes continue subindo (somente em caso de transporte feito pela própria empresa)
5 – 10 Direitos de quem sofre acidente de trajeto
Direito nº1 – CAT emitida pelo empregador
Bem, já vimos que seu primeiro direito é ter a CAT emitida pelo empregador.
Agora vamos a outros direitos, os mesmos assegurados em casos de acidente de trabalho, já que o acidente de trajeto voltou a ser equiparado a ele.
Direito nº2 – Estabilidade no emprego por 12 meses
Estabilidade no emprego por 12 meses, depois do retorno do afastamento pelo INSS.
Após um acidente de trajeto é comum que o empregado tenha que se afastar por um período para tratamentos, cirurgias e recuperar a saúde.
O empregador não pode demitir o funcionário. É uma forma de proteção para que o empregado não seja punido pelo fato de ter sofrido um acidente.
Direito nº3 – Recolhimento do FGTS pelo empregador
O acidente de trabalho dá direito a dois benefícios acidentários no INSS: o B91 ou B92. Nesses dois casos, o empregador tem a obrigação de recolher o FGTS durante todo o período de afastamento, mesmo se durar anos.
Direito nº4 – Manutenção de benefícios da empresa
A empresa deve continuar pagando o convênio médico, tickets alimentação e outros benefícios previstos em acordos coletivos ou ações coletivas do sindicato durante o período de afastamento por auxílio-doença acidentário ou aposentadoria por invalidez acidentária (hoje benefício por incapacidade permanente)
Direito nº5 – Auxílio-acidente
Caso o trabalhador fique com alguma sequela reduzindo a capacidade para as atividades que desempenhava poderá ter direito também ao auxílio-acidente. Vamos dizer que o seu acidente reduziu o movimento de um braço, de uma perna ou que fazer o trabalho que desempenhava antes, hoje causa muita dor.
O auxílio-acidente funciona como uma indenização, uma compensação por esse dano causado.
Afinal, nessas condições o trabalhador tem mais dificuldades na progressão no emprego, e mesmo que volte a trabalhar pode receber o auxílio-acidente.
Direito nº6 – Dano moral
O empregador tem a responsabilidade de ressarcir o empregado em caso de culpa ou atividade de risco. Dois exemplos dessas situações:
A empresa pode ser responsabilizada pelos danos que o trabalhador sofreu dirigindo um carro da firma com problemas de manutenção.
Será responsabilidade do empregador a indenização por danos morais em caso de acidente de trajeto ocorrido em condução fornecida pelo empregador.
Direito nº7 – Dano material
Tratamentos de saúde, médicos e medicamentos costumam exigir muitos recursos de quem sofre um acidente. A empresa tem a obrigação de ressarcir o que você gastou enquanto se recuperava, caso seja responsável pelo acidente.
Outro prejuízo que pode ser cobrado do empregador é a diferença entre o que o INSS paga ao segurado e o que ele estaria recebendo se estivesse trabalhando. O valor que a previdência paga quase sempre é menor do que o salário do empregado que muitas vezes recebe comissão ou tem um ganho maior pela produtividade, ou bônus.
Direito nº8 Tempo de afastamento para Aposentadoria
Todo o período de afastamento, que pode ser de meses ou anos, será contado para aposentadoria
Direito nº9 – Ambiente de trabalho adequado
Ao retornar ao trabalho, o empregado tem o direito ao ambiente adequado às suas limitações. O exame médico ocupacional de retorno ao trabalho irá avaliar se o trabalhador ficou com alguma restrição, temporária ou definitivamente.
Direito nº10 – Auxílio-doença acidentário ou aposentadoria por invalidez
O INSS fará uma perícia para avaliar se é caso de afastar o trabalhador recebendo auxílio-doença acidentário ou aposentadoria por invalidez.
Atenção, porque nem sempre o INSS reconhece esse direito e pode querer te conceder o auxílio-doença comum ou benefício por incapacidade temporária (B31) após a reforma da previdência, quando o correto seria o auxílio-doença acidentário (B91).
É uma troca muito prejudicial para o trabalhador, pois o auxílio-doença comum não garante os direitos que eu expliquei no tópico anterior (estabilidade de 12 meses quando retornar ao emprego e o recolhimento do FGTS pelo empregador, por exemplo)
Se o segurado pede os benefícios no INSS e a perícia é negativa, pode recorrer a uma nova perícia, desta vez judicial.
Por isso, se o INSS errou na concessão do seu benefício o aconselhável é que você procure um advogado especialista.
Outro direito do segurado é de receber a aposentadoria por incapacidade permanente acidentária e para isso é muito importante demonstrar ao INSS a natureza acidentária da invalidez.
Neste caso, o valor da aposentadoria será sempre de 100% da média aritmética simples de todas as remunerações do trabalhador, de julho de 1994 até o pedido da aposentadoria.
A reforma da previdência foi muito prejudicial à aposentadoria por invalidez comum .
O cálculo dessa aposentadoria é feito assim: primeiro soma-se todas as remunerações, desde julho de 1994 até o dia anterior a invalidez, e faz a média aritmética simples, para se chegar no salário de benefício.
Sobre o salário de benefício, se aplica uma alíquota de 60%, para todas as seguradas mulheres que tenham contribuído por até 15 anos antes de terem ficado incapacitados e para todos os segurados homens que tenham contribuído por até 20 anos antes da incapacidade.
A partir dos 15 anos de contribuição para mulheres e de 20 anos de contribuição para os homens, o cálculo vai aumentando 2% ao ano, até chegar a 100% somente para os segurados homens que tenham contribuído por 40 anos antes da invalideze seguradas mulheres que tenham contribuído por 35 anos antes da invalidez.
Fonte: Jornal Contábil